Como pensa o pediatra que criou o attachment parenting
CRESCER entrevistou, por telefone, William Sears, mais conhecido por Dr. Bill Sears, o pediatra norte-americano que compilou os conceitos do chamadoattachment parenting, um estilo de criar os filhos que ganhou espaço na mídia do mundo todo após a capa comemorativa do dia das mães da revista TIME
Cíntia Marcucci
Carregar o bebê próximo ao seu corpo, em um sling, por exemplo; começar o contato com seu filho logo após o parto; amamentação prolongada; deixar o filho dormir na sua cama. Se você está grávida ou tem filhos menores de 10 anos, já deve ter ouvido ou lido pelo menos uma discussão sobre essas práticas. Muita gente defende, outras muitas criticam com unhas e dentes. E não só por aqui.
Recentemente uma capa da revista TIME literalmente “causou” em sites, redes sociais e na mídia em geral do mundo todo. A imagem, que trazia uma mãe amamentando uma criança de 3 anos, era só um chamariz para contar a história de Dr. Bill Sears, o pediatra norte-americano que escreveu, vinte anos atrás, o livro The Baby Book (O Livro do Bebê, em tradução literal, inédito no Brasil). Best-seller nos Estados Unidos, o livro traz sete regras que devem ser seguidas para criar filhos felizes, saudáveis, e com “bom caráter”, o chamado attachment parenting, algo que é conhecido no Brasil comocriação com apego. Além das quatro atitudes citadas no início desta reportagem, estão na lista acreditar no choro do seu filho (e confortá-lo sempre), tomar cuidado com métodos de treinamento para bebês (como o que diz para amamentar a cada 2 horas ou deixar o bebê chorando por X minutos) e balancear a maternidade / paternidade com as outras áreas da vida (casamento e cuidar de si mesma).
Dr. Bill Sears tem 72 anos, oito filhos, alguns netos e conversou com a CRESCER por telefone para explicar como ele chegou aos conceitos do attachment parenting, justificar por que recomenda que os pais os sigam e comentar sobre toda a polêmica que sua teoria gera entre quem tem, está para ter e mesmo quem não tem filhos.
CRESCER - Como você chegou ao seu conceito de attachment parenting?
Dr. Bill Sears - Quando eu comecei a atuar como médico, 40 anos atrás. Eu sabia muito sobre bebês doentes, mas nada sobre bebês saudáveis e normais. Então eu comecei a observar essas crianças saudáveis e descobri muitos hábitos das mães, muitas atitudes inteligentes. Foquei nas crianças que eram bem comportadas, que eram muito saudáveis, e passei a investigar o que o pai e a mãe dessas crianças faziam, o seu estilo de criar os filhos. Foi assim que eu descobri os sete conceitos (7 Baby B’s, em inglês) - é o que esse pais faziam na maioria das vezes. Também li e ouvi relatos de pessoas que tinham viajado pela América do Sul e observaram que eram carregados junto ao corpo das mães. E contavam como os bebês adoravam, como as mães também pareciam felizes. E eu pensei: tenho que popularizar isso aqui na América do Norte!
C – Todos os seus filhos nasceram após o senhor desenvolver esse conceito?
Dr. B.S. - Sim. Foi durante, na verdade. A gente foi descobrindo também o que era melhor para os nossos filhos. A cada filho minha mulher ia amamentando por mais e mais tempo, por exemplo, pois isso funcionava muito bem para ela.
C – E seus filhos seguiram os mesmos preceitos que o senhor na crianção dos filhos deles, seus netos? Ou houve um daqueles conflitos de gerações em que os filhos resolvem fazer tudo ao inverso do que seus pais fizeram?
Dr. B.S. - (risos) Eles seguiram com esse estilo sim, acho que viram que funcionou bem, deu certo. Mas eu sempre faço brincadeiras com eles: “Oras, vocês estão bem hoje, não é?”. Sabe, é um estilo muito natural de ser pai e mãe, é quando uma mãe segue seus maiores instintos, os mais básicos. Não é nada extremo e nem é novo. O que eu fiz foi apenas pegar tudo o que as culturas ao redor do mundo sabem por séculos e reunir. Pois eu acho que nós precisamos voltar ao mais simples e natural, que sabemos por experiência milenar que funciona. Acho que era preciso trazer isso de volta.
C – Por que o senhor acha que é bom voltar para isso? Que bem, afinal, isso faz para as crianças?
Dr. B.S. - Eu estudo isso há mais de 40 anos, então eu já pude observar e estudar pessoas que hoje são adultos e foram criados seguindo esses preceitos. Eu os chamo de “crianças que se importam” (kids who care, em inglês). Eles têm o que chamamos de empatia, eles são pessoas gentis, muito sensíveis, são bons indivíduos para a sociedade. Não se transformam, por exemplo, em crianças que praticam bullying. Nós como sociedade, em todos os países, precisamos mais de pessoas assim, mais de sensibilidade. É muito raro que uma criança criada assim se torne um criminoso.
C – E por que o senhor acha que as pessoas resolveram criticar tanto tudo isso agora, o que causa tanta polêmica, em especial depois da matéria de capa da Time?
Dr. B.S. - Eu acho surreal, pois as pessoas estão se afastando do que é básico na maternidade. Para muitas mulheres, isso não tem nada de estranho, nem de extremo, é muito natural. Para outras, essa ideia de amamentar até os 3 anos é absolutamente bizarra. O ponto que eu quero mostrar a todos é que isso não é surreal em muitas e muitas outras culturas. A Organização Mundial de Saúde, uma organização muito mais do que respeitada, recomenda que se amamente por 2 anos ou mais. Então, se isso é recomendável ao mundo todo...
C - Sim, mas imagino que pessoas argumentem que isso simplesmente não se encaixa mais com o estilo de vida atual de muitas mulheres, em especial as que trabalham fora. É muito possível que muitas delas não consigam ter essas atitudes. O que o senhor diz a respeito disso?
Dr. B.S. - Eu acredito que dá para conciliar com o trabalho, sim. E mais que isso, digo que o attachment parenting é ainda mais importante para as mulheres que trabalham. Na verdade, as mulheres sempre trabalharam. Isso não é novo. Minha mulher trabalhava enquanto cuidava dos nossos filhos e eu ainda estava na faculdade. As mães são as melhores multitarefas do mundo, elas podem fazer muitas coisas ao mesmo tempo. E as mulheres podem continuar amamentando depois de voltar ao trabalho, por conta de todas as bombas de amamentação que existem hoje, muito mais modernas. Aqui nos EUA nós temos leis agora que permitem que as mulheres tirem 15 minutos várias vezes por dia para extrair seu leite em um lugar específico e depois levar para seu bebê. Então existem meios, sim, para a mãe que fica longe de seu filho. O leite materno é ouro líquido, e isso é um meio maravilhoso delas se conectarem com seu filho. Acho que o attachment parenting é ainda mais importante na sociedade atual. (Nota da editora: aqui no Brasil existem projetos de lei para que existam salas de amamentação nas empresas e também projetos para padronizar esses espaços).
C – Aqui no Brasil temos 4 meses de licença-maternidade, é bem menos nos Estados Unidos, não é?
Dr. B.S. - Sim, e dar um bom período de licença-maternidade é característica de um governo sábio. Pois é um investimento nas pessoas do futuro daquele país. É o futuro da sociedade que entra em jogo.
C – Gostaria que o senhor falasse um pouco da culpa materna. As mulheres se sentem culpadas por não estarem perto de seus filhos, não fazer isso ou aquilo por eles. O senhor não acha que dizer que elas devem amamentar por tempo prolongado aumenta ainda mais esse sentimento?
Dr. B.S. - Eu acho que attachment parenting é o contrário. Ele dá ferramentas para que ela fique mais próxima, se conecte com o seu filho, não o oposto. Ou seja, mesmo se você precisar estar longe de casa, você tem um jeito de, na volta, estar mais perto do seu filho. São coisas para ajudar, não para piorar a sensação dela.
C – E quanto aos homens? O que os pais podem fazer sobre o attachment parenting, já que amamentação é uma das coisas que só as mães podem fazer?
Dr. B.S. - É muito importante para o pai ter atitudes nesse sentido, para que a mãe não se sinta esgotada. O pai pode vestir o bebê, usar o sling, ele pode confortar um bebê que chora. É lindo ver um homem segurando seu bebê pele com pele. Vê-lo cantar para seu filho, aconchegá-lo. E os bebês amam isso. É um jeito muito bacana dos pais participarem.
C – Algo mudou desde que o senhor escreveu o livro The Baby Book?
Dr. B.S. - Acho só que fica mais claro que podemos comprovar que isso funciona. Temos como mostrar que as crianças criadas assim cresceram bem, saudáveis e hoje são adultos com boa saúde e caráter. Mas eu digo aos pais o seguinte: escolham e pratiquem o estilo de paternidade que for mais natural para vocês.
Recentemente uma capa da revista TIME literalmente “causou” em sites, redes sociais e na mídia em geral do mundo todo. A imagem, que trazia uma mãe amamentando uma criança de 3 anos, era só um chamariz para contar a história de Dr. Bill Sears, o pediatra norte-americano que escreveu, vinte anos atrás, o livro The Baby Book (O Livro do Bebê, em tradução literal, inédito no Brasil). Best-seller nos Estados Unidos, o livro traz sete regras que devem ser seguidas para criar filhos felizes, saudáveis, e com “bom caráter”, o chamado attachment parenting, algo que é conhecido no Brasil comocriação com apego. Além das quatro atitudes citadas no início desta reportagem, estão na lista acreditar no choro do seu filho (e confortá-lo sempre), tomar cuidado com métodos de treinamento para bebês (como o que diz para amamentar a cada 2 horas ou deixar o bebê chorando por X minutos) e balancear a maternidade / paternidade com as outras áreas da vida (casamento e cuidar de si mesma).
Dr. Bill Sears tem 72 anos, oito filhos, alguns netos e conversou com a CRESCER por telefone para explicar como ele chegou aos conceitos do attachment parenting, justificar por que recomenda que os pais os sigam e comentar sobre toda a polêmica que sua teoria gera entre quem tem, está para ter e mesmo quem não tem filhos.
CRESCER - Como você chegou ao seu conceito de attachment parenting?
Dr. Bill Sears - Quando eu comecei a atuar como médico, 40 anos atrás. Eu sabia muito sobre bebês doentes, mas nada sobre bebês saudáveis e normais. Então eu comecei a observar essas crianças saudáveis e descobri muitos hábitos das mães, muitas atitudes inteligentes. Foquei nas crianças que eram bem comportadas, que eram muito saudáveis, e passei a investigar o que o pai e a mãe dessas crianças faziam, o seu estilo de criar os filhos. Foi assim que eu descobri os sete conceitos (7 Baby B’s, em inglês) - é o que esse pais faziam na maioria das vezes. Também li e ouvi relatos de pessoas que tinham viajado pela América do Sul e observaram que eram carregados junto ao corpo das mães. E contavam como os bebês adoravam, como as mães também pareciam felizes. E eu pensei: tenho que popularizar isso aqui na América do Norte!
C – Todos os seus filhos nasceram após o senhor desenvolver esse conceito?
Dr. B.S. - Sim. Foi durante, na verdade. A gente foi descobrindo também o que era melhor para os nossos filhos. A cada filho minha mulher ia amamentando por mais e mais tempo, por exemplo, pois isso funcionava muito bem para ela.
C – E seus filhos seguiram os mesmos preceitos que o senhor na crianção dos filhos deles, seus netos? Ou houve um daqueles conflitos de gerações em que os filhos resolvem fazer tudo ao inverso do que seus pais fizeram?
Dr. B.S. - (risos) Eles seguiram com esse estilo sim, acho que viram que funcionou bem, deu certo. Mas eu sempre faço brincadeiras com eles: “Oras, vocês estão bem hoje, não é?”. Sabe, é um estilo muito natural de ser pai e mãe, é quando uma mãe segue seus maiores instintos, os mais básicos. Não é nada extremo e nem é novo. O que eu fiz foi apenas pegar tudo o que as culturas ao redor do mundo sabem por séculos e reunir. Pois eu acho que nós precisamos voltar ao mais simples e natural, que sabemos por experiência milenar que funciona. Acho que era preciso trazer isso de volta.
C – Por que o senhor acha que é bom voltar para isso? Que bem, afinal, isso faz para as crianças?
Dr. B.S. - Eu estudo isso há mais de 40 anos, então eu já pude observar e estudar pessoas que hoje são adultos e foram criados seguindo esses preceitos. Eu os chamo de “crianças que se importam” (kids who care, em inglês). Eles têm o que chamamos de empatia, eles são pessoas gentis, muito sensíveis, são bons indivíduos para a sociedade. Não se transformam, por exemplo, em crianças que praticam bullying. Nós como sociedade, em todos os países, precisamos mais de pessoas assim, mais de sensibilidade. É muito raro que uma criança criada assim se torne um criminoso.
C – E por que o senhor acha que as pessoas resolveram criticar tanto tudo isso agora, o que causa tanta polêmica, em especial depois da matéria de capa da Time?
Dr. B.S. - Eu acho surreal, pois as pessoas estão se afastando do que é básico na maternidade. Para muitas mulheres, isso não tem nada de estranho, nem de extremo, é muito natural. Para outras, essa ideia de amamentar até os 3 anos é absolutamente bizarra. O ponto que eu quero mostrar a todos é que isso não é surreal em muitas e muitas outras culturas. A Organização Mundial de Saúde, uma organização muito mais do que respeitada, recomenda que se amamente por 2 anos ou mais. Então, se isso é recomendável ao mundo todo...
C - Sim, mas imagino que pessoas argumentem que isso simplesmente não se encaixa mais com o estilo de vida atual de muitas mulheres, em especial as que trabalham fora. É muito possível que muitas delas não consigam ter essas atitudes. O que o senhor diz a respeito disso?
Dr. B.S. - Eu acredito que dá para conciliar com o trabalho, sim. E mais que isso, digo que o attachment parenting é ainda mais importante para as mulheres que trabalham. Na verdade, as mulheres sempre trabalharam. Isso não é novo. Minha mulher trabalhava enquanto cuidava dos nossos filhos e eu ainda estava na faculdade. As mães são as melhores multitarefas do mundo, elas podem fazer muitas coisas ao mesmo tempo. E as mulheres podem continuar amamentando depois de voltar ao trabalho, por conta de todas as bombas de amamentação que existem hoje, muito mais modernas. Aqui nos EUA nós temos leis agora que permitem que as mulheres tirem 15 minutos várias vezes por dia para extrair seu leite em um lugar específico e depois levar para seu bebê. Então existem meios, sim, para a mãe que fica longe de seu filho. O leite materno é ouro líquido, e isso é um meio maravilhoso delas se conectarem com seu filho. Acho que o attachment parenting é ainda mais importante na sociedade atual. (Nota da editora: aqui no Brasil existem projetos de lei para que existam salas de amamentação nas empresas e também projetos para padronizar esses espaços).
C – Aqui no Brasil temos 4 meses de licença-maternidade, é bem menos nos Estados Unidos, não é?
Dr. B.S. - Sim, e dar um bom período de licença-maternidade é característica de um governo sábio. Pois é um investimento nas pessoas do futuro daquele país. É o futuro da sociedade que entra em jogo.
C – Gostaria que o senhor falasse um pouco da culpa materna. As mulheres se sentem culpadas por não estarem perto de seus filhos, não fazer isso ou aquilo por eles. O senhor não acha que dizer que elas devem amamentar por tempo prolongado aumenta ainda mais esse sentimento?
Dr. B.S. - Eu acho que attachment parenting é o contrário. Ele dá ferramentas para que ela fique mais próxima, se conecte com o seu filho, não o oposto. Ou seja, mesmo se você precisar estar longe de casa, você tem um jeito de, na volta, estar mais perto do seu filho. São coisas para ajudar, não para piorar a sensação dela.
C – E quanto aos homens? O que os pais podem fazer sobre o attachment parenting, já que amamentação é uma das coisas que só as mães podem fazer?
Dr. B.S. - É muito importante para o pai ter atitudes nesse sentido, para que a mãe não se sinta esgotada. O pai pode vestir o bebê, usar o sling, ele pode confortar um bebê que chora. É lindo ver um homem segurando seu bebê pele com pele. Vê-lo cantar para seu filho, aconchegá-lo. E os bebês amam isso. É um jeito muito bacana dos pais participarem.
C – Algo mudou desde que o senhor escreveu o livro The Baby Book?
Dr. B.S. - Acho só que fica mais claro que podemos comprovar que isso funciona. Temos como mostrar que as crianças criadas assim cresceram bem, saudáveis e hoje são adultos com boa saúde e caráter. Mas eu digo aos pais o seguinte: escolham e pratiquem o estilo de paternidade que for mais natural para vocês.